Os deslocamentos guarani: revisitando as fontes documentais com Bartomeu Melià
DOI:
https://doi.org/10.20435/tellus.v22i48.856Palabras clave:
Guarani, deslocamentos, terra sem mal, fontes documentaisResumen
Neste artigo revisitamos um tema que atravessa a etnologia guarani desde o trabalho inaugural de Nimuendaju: aquele dos movimentos territoriais guarani que foram frequentemente interpretados enquanto busca da terra sem mal. O texto perpassa, sem pretensão de uma revisão sistemática, textos clássicos e suas abordagens da religião e das migrações guarani ou tupi-guarani, buscando pôr em questão hipóteses como a da busca religiosa (seja profética ou ascética) como motivação única e constante para as migrações guarani ou tupi-guarani ao longo de cinco séculos; a da anterioridade à Conquista das migrações e do motivo mítico-religioso, o que atestaria uma originalidade da cultura/religião nativas; a da cultura como experiência cuja "autenticidade" dependeria de manter-se igual a si mesma integralmente ou pela permanência de uma espécie de núcleo duro. Na crítica a estas hipóteses, o artigo visa particularmente apontar limites da etnologia quando esta não se torna capaz de uma crítica das fontes históricas documentais, construindo interpretações na base de generalizações descuidadas ou afirmação de posições ideológicas. Buscando seguir a trilha indicada por Bartomeu Melià acerca de uma necessária garimpagem “arqueológica” das fontes documentais para a compreensão adequada de contextos vividos por grupos guarani coloniais, apresentamos um exercício analítico sobre um contexto de deslocamentos guarani na primeira metade do século XVII. A análise de cartas jesuíticas do período não deixa dúvidas sobre os deslocamentos ocorridos nas regiões do Guairá e Tapé em busca de proteção contra os ataques de bandeirantes paulistas, afastando-nos da tese do motivo mítico-profético como tema central das andanças guarani. Nossa expectativa é que este exercício venha contribuir para o desenvolvimento de uma etnologia guarani disposta a refletir com a história e sob a crítica das fontes documentais.
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